31/10/2016

Doce vinho


Uma luz se acende na terceira janela do segundo andar. Havia uma planta repousando na beirada, o girassol me apontava a luz onde brotou. Imaginei a mulher que morava lá, ela deve estar sem sono para ligar a TV, será que o trabalho está muito sobrecarregado? ou é problema de amor? Ela estava usando sua pantufa colorida, um pijama amarelo e os cabelos amarrados. Eu sei quem ela é?

Lembro quando meu primeiro namorado me dizia que eu era sonhadora demais, sentia demais. Depois eu tentei calar minha boca e minha mente para agradar os artifícios alheios. Estava explodindo por dentro, era a fuga de mim mesmo. Mil perdões, só sei ser o que sou. Compreendi ao longo da vida que não adianta amputar sentimentos, crenças, jeitos por pessoas que não te amam de volta. É a moda de sofrer sem razão, ainda bem que sempre fui brega. Aquela mulher de cabelos loiros e olhos arregalados no segundo andar ainda não aprendeu isso. Eu bebo um vinho que acabei de comprar num supermercado e rastejo memórias mortas só para lembrar. As pessoas a minha volta conversam com felicidade na boca e tristeza nos olhos, a bebida precisa matar suas dúvidas e amores.

Tragam-me uísque, cerveja ou mais vinho. Tragam-me révolvers, cordas ou espadas. Que comece a luta noturna contra minha mente, que comece mais uma noite de insônia. Um brinde a mim, um brinde a Helena, Maria ou Celina seja lá qual for o nome da moça sentada naquela janela olhando pra mim, no segundo andar.